MINICURSOS
MINICURSO 01: CORPOS IMOLADOS PELO DESEJO: A CERIMÔNIA FETICHISTA NAS RUELAS LITERÁRIAS DE RUBEM FONSECA
RESUMO: O perverso nega a singularidade do outro, nega a possibilidade de existência do outro, assim reduzindo o outro a um "objeto", fixando-o no lugar de um objeto de prazer e, com isso, construindo uma narrativa em busca do deleite sem limites. No conto Passeio noturno I, de Rubem Fonseca, publicado em 1975 e censurado pela ditadura militar, tem uma narrativa que é possível ser analisada sob a perspectiva da psicanálise. O narrador personagem enuncia sua monotonia diária com o trabalho, a família e os afazeres do seu cotidiano e, quando chega à noite, erige, paradoxalemte, outra rotina repetitiva e angustiante. Tira seu carro da garagem e saí a procura de uma rua vazia para fazer mais uma vítima de seus atropelamentos regulares, vítimas escolhidas de forma aleatória, sempre de bairros do subúrbio. Diante do exposto, as discurssões seguirão as perspectivas freudiana e lacaniana sobre a perversão e, como aporte teórico complementar, recorreremos ao conceito de banalidade do mal, da filósofa alemã Hannah Arendt.
Ministrante: Prof. João Victor dos Santos (UFPB)
Dias: 14 e 15 de agosto de 2023
Horário: 13:30h às 15:30h
Modalidade: Remoto
Inscrição: https://sigeventos.ufpb.br/eventos/login.xhtm
MINICURSO 02 - AS MEMÓRIAS PROFANAM OS TÚMULOS, OS FANTASMAS EXIGEM O ESQUECIMENTO: A FAMÍLIA PERDE SEUS ESPÓLIOS NO TRIBUNAL (IM)PRETERÍVEL DE LYA LUFT
RESUMO: Imersas nas águas do imperioso rio Lete e, por isso, disponíveis aos cuidados salubres do esquecimento, as experiências ancestrais, reais (ou não), infiltram-se pelas gerações vindouras, amaldiçoando os lares em sua geografia e matemática. Na interioridade desses espaços, os inquilinos sonham (ou deliram) suas vidas, em tentativas mágicas de, quiçá, desfazerem o encanto que lhes atribuiu, paradoxalmente, as funções "civilizadas" e subjetivas, sem as quais a dinâmica tutelar não ocorreria e pelas quais, quando marcadas pelo excesso ou negligência, as subjetividades colapsam. Cumpre esclarecer, de bom grado, que a desordem, as catástrofes, as imperfeições foram, desde sempre, os elementos imprescindíveis à alquimia dos afetos, cuja composição reclama o infortúnio e o sinistro das maldições, responsáveis por conservar, alterar ou destruir – seguindo obviamente o ambíguo movimento das repetições – os enigmas que forjam a malhagem familiar. Inadvertidamente e sem quaisquer represamentos, as vozes egóicas, exímias condutoras das carruagens da tradição, elevam a família à condição de aqueduto onde circula o caldo primígeno que inaugura o processo de subjetivação. Não à toa, Mnemosine, cujo balé turva as águas léteras, sulcando-as revoltamente, adere às moções thanáticas, arremessando, das profundezas, as lembranças que reivindicam o retorno ao lar, do qual foram, atroz e compulsivamente, expulsas. Se recebem um jazigo e ritos fúnebres adequados, transformam-se em reminiscências eróticas que apaziguam e fomentam a continuidade do self. O degredo imposto, em contrapartida, decompõem-nas em fantasmas persecutórios, figurações cadavéricas, almas atormentadas que, sem complacência, afugentam o futuro e os seus habitantes. A vivência num palimpsesto transgeracional, com narrativas em ranhuras e fissuras, abala o sujeito, incrustando-o num berço de pré-investimentos narcísicos, adornados por "pais adoecidos", que, enleados nas tramas dispersas do passado, tendem a "mortificar" costumes, culturas e mitos parentais. Essas tecelagens cáusticas, urdidas, a um só tempo, por Eros e Thânatos, irrompem-se, com frequência cogente, nas territorialidades literárias, deixando, às escancaras, os sintomas que acompanham a longa jornada do homem pelas várzeas encharcadas da História. Reside, nas reflexões precedentes, a proposta deste minicurso: debruçar-se sobre a arquitetura familiar, operante nos escritos miméticos de Lya Luft, no intento de compreender a trágica economia, diegética e subjetiva, que molda personagens, incapacitando-os de gerenciar, plenamente, a herança psíquica advinda, sem reservas, de suas parentalidades, em estado bruto ou em ininterrupto processo de decomposição. Na ação silenciosa de um anjo de mármore que, anímica e fantasmagoricamente, resguarda o sepulcro da família, em A asa esquerda do anjo (1981); no espelho que encapsula o quadro dos deteriorados laços parentais, em Reunião de Família (1982); nos teatros aterrorizados por mortos-vivos, que habitam o sótão, em O quarto fechado (2004), ou nas criaturas desesperadas que povoam o porão, em O ponto cego (1999), a estética da célebre escritora gaúcha é deveras hábil em contornar, pela pena dos significantes, a depauperação dos vínculos, o esgotamento dos humanos frente ao imperativo familiar do apego. Eis que, telescopicamente, materiais tóxicos, residuais, em estado rudimentar, quando não elaborados e devidamente enlutados, sobrevivem, em estruturas físicas e abstratas, e são desenterrados pelos herdeiros-descentes. Trata-se, no jogo simbólico, de missivas postas em garrafas, à deriva no além-mar das gerações, capazes de suportar as tormentas e desfazer os redemoinhos, empreendimentos naturais de Lete e de Mnemosine.
Ministrante: Prof. Guilherme Ewerton (UFPB/PPGL/LIGEPSI)
Dias: 14 e 15 de agosto
Horário: 16h às 18h
Modalidade: Remoto
Inscrição: https://sigeventos.ufpb.br/eventos/login.xhtm
MINICURSO 03: QUANDO UM INFANTE SE "ABISMA PERPETUAMENTE": AS MELANCOLIAS E SEUS CAMINHOS ANGUSTIANTES EM PAPEL DE PAREDE AMARELO, DE CHARLOTTE P. GILMAN
RESUMO: Observando o cenário da Grécia Antiga, notava-se que a melancolia não se limitava apenas a uma condição patológica. Platão discernia duas modalidades de insanidade: uma decorrente de enfermidades, a outra influenciada por forças divinas. Poder-se-ia conjecturar que a melancolia também se enquadra nesse contexto, conforme sugere um célebre trecho de Aristóteles, no Problema XXX: "Por qual motivo todos aqueles que se destacaram na filosofia, na poesia ou nas artes demonstram evidente melancolia?" Nesta indagação, encontra-se subentendida uma distinção significativa: os seres humanos comuns podem sucumbir à melancolia patológica, enquanto há uma melancolia intrínseca que confere ao portador um estado de genialidade, uma condição "normalmente anormal". Conforme delineado por Freud (1915), a melancolia pode ser compreendida, assim como o luto, como uma resposta à perda de um objeto afetivamente valorizado – característica das neuroses narcísicas –, no entanto, ele a posiciona como uma perda de caráter mais idealizado. A melancolia está intrinsecamente ligada à privação do objeto que é removido da consciência, ao passo que o luto, em sua essência, não apresenta elementos inconscientes. Entretanto, ao traçar-se tal ideia ao do pediatra e psicanalista Donald W. Winnicott, a depressão pode ser entendida como uma forma de angústia mental que permeia a experiência humana e se caracteriza por uma profunda desilusão e desamparo interior, bem como pela falta de circunstâncias suficientemente "boas". Tangente a tal circunspecção, a introjeção denotara intergrar elementos provenientes do ambiente, abarcando ideias, sentimentos, relações e valores, entre outros (PERLS, 1997). Por outro lado, a projeção (conforme Perls) envolveria atribuir ao ambiente elementos fantasiosos que têm origem no próprio indivíduo, implicando, pois, transferir a responsabilidade pessoal para o ambiente. Todavia, Winnicott (1990) enfatiza a importância do ambiente facilitador, que fornece um espaço acolhedor e uma presença afetiva confiável, na promoção do desenvolvimento saudável do self. A vivência depressiva na visão winnicottiana é caracterizada por uma sensação de vazio existencial, uma perda de interesse nas atividades e uma dificuldade em encontrar prazer na vida. O sujeito deprimido sente-se desvinculado de si mesmo e dos outros, incapaz de experimentar uma verdadeira sensação de integridade e autenticidade. Tratando-se, pois, de uma sublimação do que se sente em relação ao ambiente, comumente ser-se-ia essencial expressar essa situação (estado melancólico) por meio de alguma forma de linguagem, neste caso, através da escrita, onde na narrativa de O Papel de Parede Amarelo, obra magistral de Charlotte Perkins Gilman, um conto sofisticado e provocativo que mergulha nas profundezas da psique humana, a princípio feminina, explorando com destreza temas complexos como repressão, melancolia e subversão. O enredo narra a trajetória de uma mulher cuja saúde mental está fragilizada, sendo levada por seu marido para uma residência alugada com o intuito de receber tratamento. Recebe instruções expressas para se abster de qualquer atividade, sobretudo a escrita, pois tal ato pode agravar sua condição psíquica. No entanto, a história é relatada por meio de um diário, que ela mantém oculto do esposo. Acomodada em um quarto que, em tempos passados, serviu como um aposento infantil e ostenta um papel de parede amarelo desgastado, que se encontra irregular, sujo e marcado por diversos danos, capturando profundamente sua atenção. Ao dedicar longas horas à análise dos desenhos sobre o papel, a narradora empreende uma empreitada interpretativa que revela muito acerca de sua própria condição. No desenrolar da representação, ela vislumbra a figura de uma mulher que se arrasta nas sombras de um padrão composto por grades e cabeças decapitadas, dotadas de olhos protuberantes. Essa mulher singular, ou talvez múltipla, conforme ocasionalmente se apresenta à narradora, parece restringir-se durante o dia, entretanto, durante a noite, a narradora consegue discernir os movimentos que ela realiza. A tentativa de decifrar o intricado desenho renova as energias da narradora, o que leva seu marido a acreditar em sua aparente melhora, "apesar do papel". No entanto, é precisamente o papel que se converte em um desafio intelectual para a narradora, mesmo embasado em devaneios. A autora habilmente tece uma teia literária, na qual a protagonista se vê enredada e aprisionada por esse elemento opressivo que a rodeia. Gilman utiliza com maestria a linguagem fragmentada e alucinante para transmitir a deterioração psicológica da personagem, cuja identidade é corroída por imposições sociais e pela marginalização da expressão feminina. Por meio de uma narrativa profundamente subjetiva, o conto desafiara as normas da época, confrontando a hegemonia patriarcal e questionando o papel da mulher na sociedade. Em suma, através dessa perspectiva em Depressão na obra de Winnicott (MORAES, 2015) e retornando ao Luto e Melancolia (FREUD, 1917) e autores pós-freudianos analisar-se-á a transferência da responsabilidade pessoal para o ambiente, tendo em vista de como uma expressão de uma perturbação na relação entre o indivíduo e seu ambiente – vazio, cisão – pode influenciar a vida da personagem.
Ministrante: Prof. Milton Douglas (UFPB/LIGEPSI)
Dias: 17 e 18 de agosto
Horário: 13:30h às 15:30h
Modalidade: Remoto
Inscrição: https://sigeventos.ufpb.br/eventos/login.xhtm
MINICURSO 04: ESPELHO FRÍGIDOS DO VAZIO, OCOS RESSEQUIDOS DA LOUCURA: O SOPRO ÁLGIDO DE NARCISO PETRIFICA AS PENAS DÉBEIS DO FANTÁSTICO
RESUMO: Orbe perene da constituição subjetiva humana, intransitivamente conjugado aos suplícios oraculares da ressentida Eco, o narcisismo oferta os contornos (in)tangíveis do Eu a partir das experiências ulteriores que forjam, inconscientemente, o(s) seus invólucro(s) estruturais. Segundo os preceitos freudianos, os (des)compassos próprios do surgimento egóico dependem das vicissitudes alquímicas das (in)dissolutas fantasias onipotentes, esteios que operam o Eu ideal, posteriormente responsável pela emergência dos ideais do Eu, garantindo a dissintonia entre os imperativos da realidade, com suas verdades castradoras, e o reino subjetivo, com seu poderio miraculoso e tétrico. Esmagado pela voracidade de ambas as demandas, o Eu, por vezes, sucumbe à dissolução de suas cercanias corpóreas, reivindicando a (in)compatibilidade de uma pele psíquica que, amiúde, sustente o poderio de suas moções pulsionais. Em tais artífices, segundo as prerrogativas reptas do páthos, admitindo os extravios ameaçadoramente sedutores do narcisismo primário, congregam-se os murmúrios especulares que sentenciaram o gélido esquife de Narciso, destino ao qual o Eu, inconscientemente, condena-se ao degrado pelo torpor jubiloso de seu gozo trágico. Assim, ante as múltiplas inervações da imagem, que desarranjam os finos véus da realidade objetiva, irrompem-se, nos campos da Arte, os testemunhos mefistofélicos do relato fantástico, seara sublimatória que conclama as disfunções do cotidiano, baseando-se na insurgência onipotente do sobrenatural. Por tais dispositivos, murmurejam-se as refrações da desmedida narcísica, molduras nas quais o páthos esparja-se na palavra insólita, adequando-se à natureza irrefreável de sua voracidade. Eis as sinfonias agônicas de Eco, emolduradas, ardilosamente, nos contos: O amigo dos espelhos, de Georges Rodenbach (1898) e A mulher no espelho - uma reflexão, da escritora Virgínia Woolf (1929); narrativas que celebram o olhar dissolúvel e aterrador de suas vítimas espelhadas. Em ambos os casos, com suas respectivas particularidades estéticas, ter-se-á a manifestação magna da onipotência narcísica, sedenta por seus despropósitos vampirescos, como no curioso caso de Rodenbach, como também, inundada de sua miríade epifânica, tal qual decorre, violentamente, no texto da mestra inglesa. Por tais paragens fantasísticas, amparando-se nas conceituações psicanalíticas de Sigmund Freud (1915) e Andre Green (1983), além das miríades discursivas do fantástico ficcional, este minicurso dedicar-se-á as faces ominosas de Narciso e suas feições adoecidas, presas da desmedida vociferante do páthos, refletidas nas margens sentenciosas de seus espelhos canibalescos.
Palavras-chave: Fantástico; Narcisismo; Psicopatologia.
Ministrantes: Prof. Me. Matheus Pereira (LIGEPSI/PPGL/UFPB) e Profa. Rebeca Monteiro (GEAL/UFPB)
Dias: 17 e 18 de agosto de 2023
Horário: 16h às 18h
Modalidade: Remoto
Inscrição: https://sigeventos.ufpb.br/eventos/login.xhtm